Modelos
Um modelo não é a realidade. O modelo é a representação de uma realidade. Digo de uma, pois há modelos de muitos sistemas, não só naturais, mas também para descrever dinâmicas sociais e económicas. Dentro de cada um destes reinos há muitas outras subdivisões, outras representações da realidade, consoante o que se está a estudar, o que se pretende aprender, o que se pretende testar.
Relativamente aos modelos climáticos existem também vários tipos. Se fizermos a divisão consoante a complexidade com que são incluídos os processos de primeira importância para a compreensão do clima [radiação, processos de dinâmica física, processos à superfície, composição química] temos vários e para não vos cansar fui buscar a figura da pirâmide. Nos anos sessenta quando o campo da modelação climática começou estávamos na base da pirâmide. Devo acrescentar que só os GCM (os mais perto do vértice) são utilizados para prognósticos quantitativos e como diz o JM com grande incerteza.
Contudo, eu também considero incerta a asserção tão limpinha (50% para ali e 50% para aqui) do excerto do artigo que o JM apresenta no seu post-scriptum. Utilizando a lógica [:-), esta o JM aprova de certeza] acho estranho que a incerteza dos cenários de emissão seja ao mesmo nível das dos modelos. Nos modelos climáticos há chão em que pisar, prever a humanidade e a sua actividade, prever os desenvolvimentos tecnológicos, parece-me mais incerto. Fui procurar nas fontes e não encontrei a base para essa divisão equitativa do bolo. Ainda que este seja um ponto importante na discussão, deve-se notar que ficando pelo extremo inferior do prognóstico, a nível climático é suficiente para que haja a necessidade de medidas de protecção e mitigação.
Os modelos foram construídos e são utilizados principalmente para a compreensão qualitativa: compreender reacções, contra-reacções, conecções… Os modelos são instrumentos essenciais. Sem eles seria impossível compreender o clima, devido à sua complexidade. Muito comum é o teste do “Se”. Se eu aumentar esta variável o que acontece àquela outra? E se eu aumentar para o dobro ou o triplo? Muitos destes testes têm mesmo de ser feitos com modelos, porque simulam-se acontecimentos no passado, no futuro ou simplesmente hipóteses. Um exemplo do primeiro caso é o paradoxo climático chamado de “Bola de Neve Terrestre” (Snowball Earth). Nos anos sessenta geologistas descobriram rochas provindas de diversas partes da Terra que exibiam os efeitos de uma glaciação extensa há cerca de 600 milhões de anos. Os gelos atingiram as latitudes equatoriais! Como pôde a Terra reverter o processo? Segundo as simulações a este nível de cobertura gelada, seria necessária uma luminosidade solar que simplesmente não poderia ter existido… Pensou-se que outros processos poderiam reverter o processo e pensou-se no nosso bom efeito de estufa. Com os oceanos gelados o principal sumidouro do CO2 deixava de existir. Por outro lado, os vulcões continuariam a emitir CO2. Pelos cálculos para que o efeito de estufa tivesse a capacidade de desfazer a bolinha de gelo seriam necessárias concentrações de CO2 350x superiores às de hoje [de notar que na altura a vida estava limitada a células unicelulares e durante a “Snowball Earth” decorreu uma das extinções em massa do nosso planeta]. Para que esta concentração fosse atingida seriam necessários cerca de dezenas de milhões de anos de emissões vulcânicas. Os registos geológicos mostram na verdade um aquecimento rápido após a “Snowball Earth”, o que apoia esta teoria que foi completamente construída com modelos. Sem estes a capacidade de procurar respostas estaria muito limitada.
Uma resposta para“Modelos”
É importante a intervenção das pessoas correctas nas alturas aproprieadas. É o que a Gabriela tem feito, tem tido uma importante contribuição para a defesa de princípios da actividade científica que são menosprezados por joranalistas que sabem de tudo um pouco, mas sabem muito de nada.
Um aspecto que focou neste texto, considero também a maior incerteza na projecção de modelos, a direcção da actividade humana. É praticamente impossível ter uma previsão fiável da utilização dos recursos e do impacte dessa utilização sobre o próprio sistema.
Comungo da sua opinião anti-inércia face a incertezas. Se a humanidade se tivesse desenvolvido sobre essa atitude, hoje não teríamos um nível de conhecimento capaz de superar as deficiências evolutivas, pelo menos na medida do razoável. Muito mais podia ser feito se assim houvesse vontade e pro-actividade nesse sentido. O exemplo de JM ilustra o tipo de mentalidade capta que não é útil à humanidade.