Um momento, entre tantos outros
Este Sábado foi bastante diferente. O Cláudio foi trabalhar quatro dias esta semana, um feito assinalável. Conheci o Cerveira Pinto, um habitual aqui do blog e andei com ele boa parte da tarde a dar uma volta pelo terreno. O meu pai não só foi comigo, como se fartou de ajudar — sempre a reclamar, claro. Mas, proclamei-o o maior caçador de escaravelhos do Vale do Bestança.
O ataque de escaravelhos nos primeros regos a Norte, tem sido violento. Essa cultura está praticamente perdida. Acaba-se com dezenas ou centenas de manhã e de tarde está lá a mesma quantidade. A boa notícia é que a progressão para Sul tem sido praticamente nula. Agora coloquei uma “parede” de palha para a tornar ainda mais lenta. Admito que seja coincidência, mas os escaravelhos aparecem todos do lado onde existiram batatas o ano passado. Com o calor que tem estado, sentem-se em casa.
Plantamos finalmente e algo tarde, os meloeiros, mais courgettes e alfaces. Retiramos ervas, regamos… Estou farto de prometer a mim mesmo, que me vou deixar de horta por lá. A horta é uma cultura de proximidade, requer cuidados e atenção quase diária. Mas, é irresistível, ter umas sementes e vê-las a nascer…
Consegui colher cerejas (bichadas forte e feio), quase um quilo de groselhas maravilhosas e batatas brancas e vermelhas. O Cerveira Pinto ainda nos deu laranjas divinais de Boassas. Tinha lá uma laranjeira que também dava limões. Nunca tinha visto.
Ao fim da tarde, foi o meu pai o primeiro a reparar na nesga de Sol que atravessava o vale. Ficamos os três a admirá-lo, convencidos. Sentimo-nos especiais por estar aqui.
Uma resposta para“Um momento, entre tantos outros”
Cheguei a este blog vindo de uma pesquisa no google por escaravelho da batata. Comecei-o a ler desde o início e não parava de me espantar com tantas coincidências: nasci e vivi na Sra. da Hora durante quase 30 anos, estudei na FEUP, trabalho em casa e tenho também uma quinta, também ela situada no vale de um rio, o Sousa, onde vivo desde há quatro anos.
Há uns anos atrás sentia que remava contra a maré, que ía contra tudo o que via fazer à minha volta; mas depois de tomar conhecimento da “Terceira Vaga” de Alvin Toffler, senti-me, subitamente, acompanhado de milhares de anónimos que, por esse mundo fora, pertencem já ao mundo de amanhã.
Quero dar-te os meus parabéns por teres publicado este blog. Para além do prazer que é ler os teus relatos – e da curiosidade dos links – sabe imensamente bem poder fazer parte desta espécie de comunidade global, para nos dar força nas nossas acções locais.
Ah, a pesquisa no Google… Aparecemos à frente da Bayer, Syngenta e demais pesos-pesados da agroquímica. É a glória!
Realmente há umas coincidências interessantes, menos uma — nós ainda não vivemos no campo, nem será para tão cedo essa mudança. Parabéns por teres mudado, que os quatro anos se prolonguem por muitos mais.
A tua quinta produz? O teu trabalho é exclusivamente relaccionado com a quinta?
Aqui há uns anos, falou-se muito da “terceira vaga”, mas confesso que hoje já não sei do que se trata. Lembro-me apenas que tinha implicações económicas grandes, aliás, pensava que era uma teoria económica.
Obrigado por teres aparecido.
A terceira vaga é um conceito muito abrangente, desde a economia à sociologia e cultura – é a vaga do conhecimento. Os dois apectos a que me referia, típicos da descrição do Toffler, são o estabelecimento de comunidades intencionais (como esta, à roda deste teu blog) e o facto de cada vez mais se procurar esta ligação à produção ou autosuficiência (fartas de tanta especialização no emprego e de terem de ir ao “mercado” comprar tudo o resto, as pessoas sentem cada vez mais a necessidade de serem elas próprias a produzir o que consomem – “prosumir”).
É um pouco o que tento fazer aqui em casa. Um pomar farto e variado – que dá pouco trabalho e bom “fruto”; uma horta – que acaba sempre por exigir mais tempo do que aquele que eu tenho; uma “floresta…zinha” para gozar a sombra e arranjar alguma lenha para o recuperador de calor.
O problema geral é sempre a falta de tempo… e se morar aqui por um lado facilita as coisas, por outro faz com que todos os dias, enquanto estou agarrado ao computador a desenvolver software, olhe lá para fora e me impaciente com o que há por fazer.
Entendo, entendo. John Seymour simplificou um pouco as coisas, mas acho que passa muito por esses conceitos.
Estás a fazer o que eu acho que devia fazer e me estou a preparar para fazer, mais cedo ou mais tarde. Agora temos as crianças e não queremos sacrificar nadinha da sua educação — e o melhor que lhes podemos dar nesse aspecto, está por aqui. A mudança vai ter que ser gradual.
Também entendo essa impaciência. Também eu gostava e precisava de estar em dois lugares ao mesmo tempo, muitas vezes.
Que tarde fantástica no Sargaçal. O Vale do Bestança é realmente fabuloso e é bom saber que há pessoas assim a fazer praticamente o inverso do que todos fazem (não só no Bestança, infelizmente). Não tenho dúvidas, porém, de que o Sargaçal (tal como o “blog”) será, dentro em breve um sucesso e uma referência desta mencionada “Terceira Vaga”. Obrigado pela referência às laranjas. Pode ser que assim as pessoas comecem a interessar-se pela nossa (de Portugal) fruta, sem tratamentos mas cheia de sabor, em detrimento dos produtos insípidos e estéreis dos supermercados. Um grande bem-haja José Rui foi um verdadeiro prazer. Até sempre.