Se quiseres cultivar a paz, preserva a criação

Neste fim de ano, com o tempo pouco simpático para o ar livre e o trabalho com um abrandamento assinalável, tenho andado no Ambio a comentar uma série de discussões sobre alterações climáticas. A maior parte dos textos são do inevitável Henrique Pereira dos Santos, mas no bom sentido. Neste caso, sempre do lado que a minha opinião classifica como certo.
O reacender destas discussões vem via “climategate”. Os negacionistas (auto-proclamados cépticos) ganharam um novo alento e andam animados. E com o Inverno também, que está rigoroso. Mas, no essencial, é a mesma conversa, em círculos, que já aqui e no Blasfémias tivemos há quatro ou cinco anos. Tudo evoluiu menos os argumentos negacionistas, tirando o “climategate” não há rigorosamente nada de novo.
Eu antes de ter o blogue, desconhecia a existência destes tratantes. Radicais anti-ambiente, com quem nem conversar se pode sem ser logo mimoseado de “crente” a “comuna”.
Entretanto, o Henrique Pereira dos Santos resolveu com grande oportunidade citar a mensagem do Papa Bento XVI para o Dia Mundial da Paz. E atentem ao que chega um tratante anónimo que por lá vegeta:

Como ficar indiferente perante as problemáticas que derivam de fenómenos como as alterações climáticas, a desertificação, a deterioração e a perda de produtividade de vastas áreas agrícolas, a poluição dos rios e dos lençóis de água, a perda da biodiversidade, o aumento de calamidades naturais, o desflorestamento das áreas equatoriais e tropicais? Como descurar o fenómeno crescente dos chamados «refugiados ambientais», ou seja, pessoas que, por causa da degradação do ambiente onde vivem, se vêem obrigadas a abandoná-lo – deixando lá muitas vezes também os seus bens – tendo de enfrentar os perigos e as incógnitas de uma deslocação forçada? Com não reagir perante os conflitos, já em acto ou potenciais, relacionados com o acesso aos recursos naturais? Trata-se de um conjunto de questões que têm um impacto profundo no exercício dos direitos humanos, como, por exemplo, o direito à vida, à alimentação, à saúde, ao desenvolvimento.

Esta é a citação publicada junto com o link para a Agência Ecclesia, para que os interessados pudessem contextualizar as frases de Bento XVI.
O biltre na sua cegueira radical começa com esta pérola de fino recorte:

Era só o que faltava travestir os textos do Papa, reinterpretando o conteúdo da sua mensagem de ano novo de 2009 e da encíclica “Caritas in Veritate”, de forma a torná-lo o porta-voz concorrencial de AlGore e do IPCC, para veicular o apocalipse climático de origem humana.

Não há nada sagrado para esta gente. E continua de forma inusitada:

O texto que aqui foi colocado é uma mera interpretação feita pela agência de notícias da Igreja Católica (Eclésia) portuguesa, que por sinal nem está assinada.

O biltre, não satisfeito em tentar enlamear o Henrique Pereira dos Santos, tenta enlamear a Agência Ecclesia de uma forma obsolutamente desajeitada.
Não é necessário ser nenhum Sherlock Holmes, nem especialista em questões da Igreja Católica, para saber que se a Agência Ecclesia publica algo com o título “Mensagem de Bento XVI para a celebração do Dia Mundial da Paz”, não se trata de uma “mera interpretação (…) que por sinal nem está assinada”, trata-se simplesmente da mensagem de Bento XVI para a celebração do Dia Mundial da Paz.
Na sua exaltação, o biltre revela que acredita em alguma coisa:

Porque também eu acredito que este Papa não se deixa enredar em interesses obscuros, aqui fica o link da sua mensagem sem as interpretações distorcidas de intermediários:
Mensagem de Bento XVI para a celebração do Dia Mundial da Paz, 1 de Janeiro de 2009

Ainda bem que é assim. Porque, como por esta altura já se deve ter tornado óbvio, o fanfarrão tenta desmentir a mensagem de Bento XVI proferida em 2010 (Vaticano), que Henrique Pereira dos Santos cita e a Agência Ecclesia publica na íntegra, utilizando para isso a mensagem de 2009 (Vaticano). E termina com mais uma fanfarronada e uma tentativa de reinterpretação de outro texto do Papa.
Sou da opinião que ambas as mensagens devem ser lidas na íntegra, tal como outros escritos de Bento XVI, talvez um dos melhores intérpretes contemporâneos dos tempos que atravessamos. Uma integridade que contrasta de forma veemente com a nulidade destes velhacos em que se tropeça a cada passo.

Uma resposta para“Se quiseres cultivar a paz, preserva a criação”

  1. Pedro Aniceto

    Acompanho-o há anos nos seus escritos neste blog. A facilidade com que você insulta as pessoas que não estão de acordo com a sua opinião, fascina-me…

  2. José Rui Fernandes

    Caro Pedro Aniceto, obrigado por passar por cá há tantos anos. Reconheço que alguma paciência é necessária.
    Facilidade? Não imagina o que me custa dar à estampa, ou melhor ao ecran, as palavras correctas e na exacta medida e proporção para descrever esta situação! Custa mesmo.

    Permita-me que lhe retribua o fascínio. De certa forma pode-se dizer que é mútuo: ataca-se uma citação do Papa e a publicação da mensagem anual no site Agência Ecclesia, com base na mensagem do ano anterior. Pela simples razão de Bento XVI ter tocado no assunto “aquecimento global” (nem é a primeira vez). E isto é questão de minha opinião? Fascinante de facto.

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