Como pode ser isso

No mundo todo não há nenhum sítio para mim. Exilado aqui, no planeta Terra, sou um estranho entre estranhos. Um estrangeiro entre a raça dos homens. Consigo suportar as forças hostis da natureza, ou mesmo a dilacerante angústia da solidão eterna, mas não aguento os acessos incompreensíveis da loucura humana. Não posso ficar aprisionado num mundo sem razão. Tem de haver uma fuga. Tem de haver uma maneira de alcançar a tranquila plenitude do espaço. Ou então que conheça a morte, em vez desta vida sem sentido. Quanto mais tempo tenho de ser um prisioneiro no selvagem planeta Terra? Quanto tempo antes que a solidão me destrua? Este não pode ser o meu destino eterno. Não foi para isto que renunciei à minha terra, à minha vida, ao meu amor. Sou odiado e temido pelos mesmos humanos que o meu coração quer ajudar. Eu disse o meu coração? Como pode ser isso, se eu não tenho coração?

(Monólogo do Surfista Prateado, versão Pedro Mexia da crónica A Barreira Invisível no livro “O Mundo dos Vivos”, Tinta da China 2012)

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