O portão

Hoje apareceu cá o Sr. Nuno, estava eu a preparar-me para o banho matinal. Como insistiu muito em falar comigo e pediu à Susana uma pistola para dar um tiro da cabeça, lá me arranjei… O problema, é o portão.

Nunca vi o Sr. Nuno assim, mortificado, cabisbaixo — e principalmente a falar baixo, quase em surdina. Não sabia como me dizer, mas depois, a custo, lá saiu. Meteu-se numa estrutura para a qual não tem alicerces. Nem dorme. O suor escorre por ele abaixo, à noite, a pensar no portão.
Explicou-me com detalhe que se trata de um portão com 4500mm (ele fala sempre em mm) e nem cabe na garagem onde faz as coisas. No fundo o que ele é? Um habilidoso. Limitado em conhecimentos, porque não admiti-lo. Faz umas coisitas, com duas rebarbadeiras e uma máquina de soldar. Não há hipótese de me fazer o portão. Tem lá 40 contos de material, um prejuízo.
Mas, por partes. Cada folha do portão tem apenas uns dois metros, ou seja, já é mais manuseável. Alto, já tenho de lhe dizer para falar baixo — tenho duas crianças a dormir lá dentro. Afinal só precisava de algum alento, arrasta-me porta fora, mal tenho tempo de vestir um fato de treino por cima do pijama. Vamos ver um portão que até para Itália foi para pintar!
Chegamos à presença de um modelo de portão como eu quero, com a diferença que este tem oito metros de comprimento por dois de altura, mas é Bekaert — foi de onde “pedi emprestado” o modelo. Mede daqui, mede dali, o Sr. Nuno parecia o dono do sítio (que afinal era da APDL). Arrancamos a toda a velocidade para a garagem, isto é, oficina, do Sr. Nuno. Pelo caminho explica-me que o carro bebe como uma mula, mas ele também lhe dá bem de mamar, tem o pé pesado. Ainda nem estou bem acordado, as emoções arriscam-se a ser demasiadas.
Chegados à oficina, o berreiro já é constante. Gesticula furiosamente enquanto me explica que só precisava de algum alento. Perguntou opinião ao vizinho, que tem sido um bom colaborador, mas é um bota-abaixo! Em resumo, um “autocrítico” do c******! Se não precisasse dele, já o tinha despachado. A mulher a mesma m****! Outra bota-abaixo, é só aos “arrepelões”.
No regresso, explica-me no seu estilo colorido, que tudo tem um princípio, um prolongamento e um fim. A conversa passa para as crianças. Já tenho dois, tenho de ter juízo, porque a vida não está fácil. Digo-lhe que o Pedro nasceu no mesmo dia da Luisa. Está incrédulo, insiste que é de outro mês. Explico que é do mesmo mês, com um intervalo de dois anos.
“Mas isso é inédito c******!”

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