Diário do horticultor urbano (muito) amador…
Dia 15 de Março de 2006 ficará certamente como marco, de uma loucura bem ou mal sucedida, mas que será memorável, concerteza.
Ao começar convém sempre um certo historial, uma introdução, e o explicar do “porquê?” de tudo isto. Sendo assim, há bastante tempo que alguém me falou sobre eventualmente eu criar uma pequena cultura de plantas aromáticas em casa, para qualquer eventualidade, nomeadamente temperos frescos, ainda para mais gostando eu especialmente de massas. Também por causa de ter à mão, e frescos, os elementos para os tão às vezes necessários, relaxantes ou medicinalmente aconselháveis chás. Mas na altura a ideia não se desenvolveu…
Não foi por falta de mérito de quem me deu e insistiu na ideia (sim Peter, estou a falar de ti), mas por clara e evidente preguiça minha, ainda para mais não sendo eu um particular interessado ou adepto de botânicas e afins. Entretanto boas ideias (admito!) como esta têm a mania de ressurgir, qual destino por cumprir e que voltam à nossa vida para se realizar. Falando com o José Rui, por causa do seu blog e de me ter convidado a nele participar, ele lançou de novo a ideia, de mostrar às pessoas como é possível cultivar em casa, mesmo num apartamento, com ou sem varandas, enquanto eu sorria e pensava: “Onde é que eu já ouvi isto!?”. “Ruminei” a ideia, explorei mentalmente as hipóteses, estudei as chances e esquematizei um plano de acção… mas tudo ficou no meu cérebro, até ao fatídico dia 15 de Março de 2006. Eis senão, quando ao acordar, nesse pré-primaveril dia e ao verificar o meu correio, descubro algo que me despertou o interesse. Um catálogo, como muitas vezes recebo, de uma companhia de vendas por correio, o “La Redoute”, no entanto não sendo este um catálogo qualquer de roupas e afins… era sim “O” catálogo. Um catálogo primaveril, cheio de ideias para o que aí vem, com coisas para a casa e mais que isso, para o jardim, ou para criar um jardim ou horta, ou nem isso: para criar num pequeno espaço em casa, um pequeno canto de verde. E foi aí que clicou o botão de acção em mim, foi aí que percebi que melhor que aquilo não se poderia pedir, e já não havia hipótese de desculpas com o muito trabalho e do não ter tempo para comprar algumas coisas, entre outras… Tanto “click” fez, que de facto iniciei esta aventura de “Horticultor Urbano Amador”… Depois de dialogar com o José Rui, de lhe mostrar o catálogo e pensar um bocadinho, e em menos de 24 horas, lá fiz a encomenda de uma série de material para me iniciar na aventura. E que mais se pode querer ou pedir quando até vêm entregar as coisas todas a casa?
Uma resposta para“Diário do horticultor urbano (muito) amador…”
[…] Não se julgue que ao encetar esta aventura didáctica como o é este “Diário do Horticultor Urbano (Muito) Amador” que não tenho receios. Estupidez pensarão, mas eu acho que não, senão vejamos: se a exposição mais ou menos pública já pode ser um risco, a exposição de um fracasso normalmente é um risco ainda maior, se bem que dos fracassos se fazem êxitos e se pode aprender e ensinar muito a quem queira assimilar o que fazemos. O risco aumenta quando o que escrevemos está à disposição para ser comentado e criticado, podendo ser alvo da maior ou menor malícia de alguns. Mas que demais receios poderei ter eu ao iniciar tudo isto? Mais alguns… essencialmente tendo a ver com orgulho pessoal e de tentar não cair no ridículo total, senão vejamos 3 deles: 1º. A minha família tem um historial todo ele ligado “à terra”, e ao trabalho nela, muito bem sucedido (basta ver os “jardins suspensos” da minha Mãe por casa…). Nunca se sabe se eu serei mais uma estrela, mas se calhar a cadente… isto assumindo (e sabendo) que as coisas podem ser mais complicadas que simplesmente: um espaço em casa, um vaso, terra, sementes, água, e em que depois se usa a receita de “coloca-se o vaso num espaço, terra no vaso, sementes na terra, água na mistura, espera-se e pronto — cresce tudo maravilhosamente!”. 2º. Economicamente gastei algum dinheiro. Não muito, mas algum, o que em tempo de crise não é aconselhável. Mania minha de a ser a sério, esta aventura didáctica, começar do nada e desenvolver as coisas a partir daí. Se isto der para o torto terei alguns remorsos do dinheiro gasto que eventualmente teria melhor destino, e uso, junto por exemplo de uma qualquer associação ou grupo que ajude animais em risco como por exemplo o “Bichanos do Porto“. 3º. Academicamente também tenho um problema, pois supostamente as pessoas costumam achar que quem tem um determinado curso deverá saber mais que o comum dos mortais (quando às vezes sabe tanto ou menos do que muito boa gente), e quando é razoavelmente falso que um canudo dê os conhecimentos, sabedoria ou a arte para seres automaticamente um sucesso numa série de coisas… Dito isto assumo no entanto que poderei ter “armas” adicionais ou suplementares que quando bem usadas me poderão ajudar ou defender, apesar de botânicas e afins nunca terem sido do meu particular interesse, gosto e jeito. Mas esta questão mais me faz pensar na queda num certo ridículo “potenciado” caso as coisas corram mal, mas paciência… Como simples mortal, com muito para aprender, desejo e curiosidade em experimentar, assumo esta aventura e parto à descoberta… e do processo pretendo fazer o relato… […]
[…] Muito bem, que encomendei então eu para iniciar esta didáctica aventura e continuar com o meu “Diário de Horticultor“? Aqui segue a lista… Primeiro que tudo encomendei um conjunto completo de jardinagem, sem o qual achei que não daria para trabalhar, ou seja: 2 tesouras de podar, um ancinho, um sacho, uma pá em inox e pega em madeira, além de um vaporizador, tudo acondicionado numa maleta em tela de canhâmo e algodão. Muito ecologicamente correcto portanto. Também encomendei uma miniestufa, em acrílico (em princípio não tão ecologicamente correcto…) e metal galvanizado, com dois sistemas de ventilação e pegas que mesmo não servindo de estufa será mais um espaço para cultivar. Surpreendido pela oferta “Morangueiro Silvestre” encomendei um conjunto completo para cultivar morangos silvestres (ou supostamente silvestres) em casa, um conjunto formado por uma jardineira em zinco, um saco de terra, bolinhas de argila para não se perder humidade na cultura e uma saqueta com as sementes. Entretanto já há quatro variedades de ervas aromáticas que sei que vou cultivar (ou tentar): tomilho, salsa, cebolinho e manjericão, conjunto de quatro vasos (sim, em zinco…), com respectivas sementes. Com mais ideias e necessidade de espaço de cultura encomendei um conjunto de zinco, constituído por mais uma jardineira com pegas e três vasos. De resto o que poderá vir a ser o meu primeiro erro à partida no meio desta encomenda toda foi ter pedido um conjunto de três pés irrigadores, sistema gota a gota, que não tenho a certeza se funcionarão (o José Rui diz que não funcionam… mas depois testarei). Bom, assim ficou completa a encomenda e enquanto a fazia só me lembrava que com tanto uso de zinco (parece estar mesmo na moda), e metal “crú”, em vasos, a fase deve estar boa para a reciclagem de velhas latas de tinta, ou afins, apesar de o metal ser outro… […]
[…] Continuando com este Diário e escrita a encomenda, não foi possível evitar ir colocar o envelope com a mesma no correio, que o comodismo não pode ser extremo. E lá fui, aproveitando que tinha uma reunião profissional mais tarde. Tanto fui, que assim que deixei o envelope na estação de correios me veio à cabeça, derivado de todo este entusiasmo inicial, a ideia de resistir a uma visita à secção de jardinagem de uma qualquer grande superfície, em busca do que semear, e… “Porque não visitar uma loja tradicional relacionada com o assunto?”. Existindo várias na Rua Mouzinho da Silveira, para onde me dirigi, acabei por ir mesmo à “A Sementeira”, casa secular que vai resistindo ao tempo e tempos… Presumo que tenha parecido um “turista”, alguém completamente fora do meio, entre algumas senhoras que procuravam bolbos e sementes para os seus jardins e algum raro agricultor resistente que procurava algo para as suas culturas. Eu por mim dispensei o atendimento personalizado e fui distraindo o olhar pelo que que via, mas mais que o olhar fui distraindo as mãos pelos envelopes cheios de sementes distribuídos por armários e “cabides”. Desta minha visita, virando-me primeiro para a direita mal entrei, encontrei uma selecção de sementes de agricultura biológica, infelizmente de origem Italiana. Entusiasmado, e meio ao acaso, trouxe manjericão (asneira minha porque já virá também com a encomenda), chicória, alface e espinafre. Será que conseguirei cultivar isto tudo? Veremos, mas promete ser divertido, especialmente se eu já tiver feito asneira na conciliação do espaço/condições/cultura/espécie. Acabei entretanto por me virar para a esquerda quando umas senhoras abriram um armário envidraçado e um aroma intenso de ervas aromáticas me chamou a atenção. Não sendo sementes provenientes de culturas biológicas, mas novamente dos mesmos produtores Italianos trouxe dessa secção alfazema, anis verde, hortelã e oregãos. Infelizmente esqueci-me do rosmaninho, ou alecrim, que tanto queria. E quando fui a pagar não me foi possível trazer, por não haver, algo que terei muito gosto em experimentar cultivar escapando só às “ervas”, “folhosas” e aos morangos: tomates, daqueles pequeninos. Vá lá que resisti a trazer sementes de melancia, coisa que não me importava nada de cultivar para depois comer. Saí satisfeito, impulsionei um pouco o comércio tradicional, e esta visita foi mais uma novidade para mim, trazendo ainda como bónus uns folhetos com a marcação das sementeiras e um catálogo de bolbos de flores. Ironicamente também pensei que calhou bem, sendo eu apreciador das famosas massas italianas, ter trazido as sementes que me darão alguns dos condimentos para elas, provenientes de produtores italianos… Entretanto quanto à minha reunião? Atrasei-me claro, ainda para mais com o trânsito, mas não tanto que ainda houvesse quem se atrasasse mais que eu, o que quer dizer que cheguei a tempo… algo que, se não me engano, é, ou vai sendo algo, tipicamente Português. Enfim, uma tarde em cheio. […]